Cultura

“Uma Família Quase Normal”, de Mattias Edvardsson | Suma de Letras

A critica literária desta semana centra-se num livro que certamente irá ao encontro de todos os "amantes" de literatura.

Uma família quase normal, do autor Sueco Mattias Edvardsson traz ao público Português um Thriller de leitura verdadeiramente compulsiva, que vai manter o leitor agarrado ao livro a devorar página a página para chegar ao aguardado capítulo final.

A premissa inicial é a acusação de homicídio que recai sobre a filha adolescente de uma banalíssima família da classe média Sueca. As personagens centrais da trama, são precisamente Adam, o pai de família, um recatado, contido, moralista e controlador Pastor da Igreja Sueca, Ulrika, a mãe, advogada criminal com uma carreira já bem construída, é reservada, viciada no trabalho e extremamente focada no sucesso profissional, e é, até ao início da terceira parte da obra a personagem mais misteriosa do trio; por fim temos Stella, a adolescente rebelde, inteligente e determinada, trabalha como empregada numa loja de roupa, e tem como melhor amiga, de quem é inseparável a estudiosa e obediente Amina, cujos pais são amigos dos progenitores de Stella.

A narrativa está organizada em três partes distintas que correspondem, precisamente, ao percurso da trama sob o ponto de vista de cada um dos seus protagonistas: Adam (o pai) ; Stella (a filha) e Ulrika (a mãe).

Com elevada densidade psicológica, um discurso intimista mas fluído que nos transporta para o interior da mente e das emoções cruzadas de cada uma das personagens, revelando ao leitor os seus conflitos internos, apreendemos a dinâmica de uma família que, ao ver-se envolvida num caso de polícia, faz também uma auto-reflexão e auto-crítica, desconstruindo ideias feitas e reconstruindo-se como colectivo perante si mesma.

O Advogado Michel Bloomberg, reconhecido criminalista que irá assegurar a defesa de Stella retrata o sistema judicial e os seus vícios e virtudes. O livro chama também a atenção para a forma como cada um de nós olha para os grandes casos mediáticos da justiça: “O que conta verdadeiramente é o tribunal da opinião pública. Em geral as pessoas não querem saber do que os tribunais decidem(…) Basta uma semana na prisão para que toda a gente te considere culpado.” – p. 143

O que faríamos se alguém muito próximo fosse acusado de homicídio? O amor justifica tudo? ” O amor é uma das tarefas mais difíceis do homem (…) É possível continuar a amar um assassino?” – p. 71

Uma magistral obra literária que fica connosco muito depois da leitura, e que nos evoca temáticas como o “ser” e o “dever-ser”, a cultura da aparência, do politicamente correcto, do parecer bem ou mal. Muito interessante também a alusão a Freud, chegando mesmo Stella a afirmar: “Demasiado Freud põe qualquer pessoa maluca.” p. 189. O autor introduz ostensivamente temáticas e conceitos inerentes à teoria Freudiana, tais como a culpa, a vergonha e a negação, explorados através da forma como os protagonistas apresentam a sua perspectiva sobre os factos narrados.

Será que em situações limite estamos sempre dispostos a cumprir à risca as normas sociais em que sempre julgámos acreditar? – “Há valores que não podem ser explicados nem medidos através de normas.” p. 403

Mais do que uma história viciante, descrita de forma muito visual e cinematográfica, com uma brilhante caracterização psicológica das personagens, com episódios violentos, temos aqui um thriller que nos faz pensar e que nos coloca o claro desafio de nos imaginarmos no lugar daquelas personagens com as quais é fácil empatizar, precisamente por serem pessoas comuns.

Brilhante, intenso, de leitura compulsiva e a desafiar os leitores! Uma belíssima sugestão de leitura para este início de ano que vivamente recomendamos aos adeptos de thrillers e que resultará numa excelente companhia para mais um confinamento.

FICHA TÉCNICA DO LIVRO:

Título: Uma família quase normal

Autor: Mattias Edvardsson

Editora: Suma de Letras |Grupo Penguin Random House

Edição: Janeiro de 2020

Nº de Páginas: 472

PVP: €19,90

Classificação: 5/5 Estrelas

Nota de edição: Crítica publicada em colaboração e sob autorização do nosso Parceiro Nova Gazeta, jornal especializado em literatura, ali publicada originalmente em  20.01.2020, tendo sido reeditada pelo Diário do Distrito.

A autora escreve ao abrigo do anterior AO


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