A culpa é mesmo do juiz Ivo Rosa???
Olá caríssimos(as) leitores(as), estou escrever já sob pena de vocês pensarem que eu teria partido para outro planeta ou da vida terrena.
Esta semana e a semana passada foram pródigas de acontecimentos quer no campo social quer no campo da justiça. Ou será que foi no campus da (in)justiça???
Estou a falar é claro do caso “OPERAÇÃO MARQUÊS”, que está a fazer correr muita tinta na comunicação social. Mas também nas redes sociais com uma petição que passou as 200.000 assinaturas com o objectivo de afastar o Juiz Ivo Rosa da magistratura.
Pessoalmente confesso que a assinei e fui atrás da populaça.
Porque de cada vez que um cidadão usa a figura da petição pública é porque de alguma forma quer participar nos destinos da nação de forma directa e democrática. Esta é a única forma de democracia directa que nos deixam ter actualmente no que toca aos assuntos nacionais.
O voto é democracia indirecta, pois aí elegem-se representantes.
O problema desta petição é que infelizmente quem a escreveu não tinha literacia jurídica suficiente e remeteu a mesma para a Assembleia da República em vez de a enviar para a Procuradoria Geral da República.
Os juízes são desresponsabilizados dos seus actos, (no sentido em que não podem ser individualmente responsabilizados por uma má decisão) e no caso de pagamento de indemnizações é o Estado que é demandado (convocado/obrigado) a proceder ao pagamento de indemnizações em caso de erro judiciário.
E o que é que levou a esta petição? Mais uma vez o caso “OPERAÇÃO MARQUÊS” com o nosso ex-primeiro ministro José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. É assim que este senhor é referido no processo. Como qualquer cidadão comum deste país. Não tem lá nenhum Eng., nem Dr.
Isto nas redes socais foi um forrobodó desde as críticas mais inflamadas até aos “memes” (piadas com uma imagem que pode ou não ser alusiva a uma pessoa ou assunto).
Pessoalmente fartei-me de partilhar algumas. Isto porque a classe política na sua grande maioria para mim não merece crédito e muito menos respeito. E isto essencialmente ao nível do poder central. Felizmente que ao nível das autarquias ainda vamos tendo alguns exemplos de gente que dá o seu melhor em prol dos cidadãos.
Este caso conheceu na sexta-feira da semana passada mais um episódio que foi o final da instrução do processo-crime. Ou seja, houve um juiz que foi destinado a ouvir os argumentos das defesas dos arguidos, par os mesmos poderem dizer ao tribunal os motivos pelos quais não devem ir a julgamento, devendo em vez disso ser mandados em paz e o processo contra eles ser arquivado.
É nesta altura que o juiz decide se leva ou não a julgamento o(s) arguido(s) ou não e se os pronuncia (confirma os crimes de que são acusados) ou emite um despacho de não-pronuncia.
Neste caso em concreto o juiz Ivo Rosa decidiu pela não-pronuncia de alguns dos arguidos, tendo apenas pronunciado 5 dos 12 iniciais, e contra estes que irão a julgamento, deixou ainda cair alguns dos crimes pelos quais eram acusados pelo Ministério Público, ficando apenas para julgamento os crimes de branqueamento de capitais e fraude fiscal.
Ivo Rosa levantou ainda o arresto dos 2 apartamentos de José Sócrates na rua Castilho em Lisboa.
E foi isto que gerou a revolta popular.
Realmente é escandaloso que José Sócrates tenha conseguido safar-se de algumas acusações. O homem que nos deixou na pré bancarrota, que gastou rios de dinheiro num projecto de um TGV que nunca saiu do papel e foi um desperdício de dinheiro dos contribuintes portugueses. O mesmo que é acusado de ter lucrado com as negociatas do antigo BES e de ter levado a Portugal-Telecom a uma situação de quase indigência quando como primeiro-ministro incentivou negócios ruinosos no Brasil.
O homem que tinha um monte no Alentejo; um luxuoso apartamento em Paris. E levava uma vida faustosa. Tudo sem ter aparentemente meios de fortuna que sustentassem tal nível de vida.
O processo é gigantesco. As ramificações passam não só por Portugal como também pela Suíça; Angola; Argélia; Brasil e Venezuela.
A opção do ministério público de produzir este mega processo-crime é talvez o seu maior calcanhar de Aquiles. Ao investigar em tantas frentes produziu um “monstro”. E que talvez tenha levado à data da acusação a prescrição dos crimes de corrupção neste processo. Talvez de se tivesse partido o processo em vários conforme as entidades envolvidas se pudesse chegar mais facilmente a condenações.
Do outro lado temos a conduta dos arguidos e a forma intrincada altamente sofisticada como montaram todo este esquema, que não deixou ao MP outro caminho que não fosse juntar todas as pontas do novelo.
Este processo só em números é gigantesco: 12 arguidos; 44 testemunhas; 85h56m em interrogatórios aos arguidos; 47h08m às testemunhas; 77 nulidades e reclamações pedidas pelas defesas dos arguidos; realizadas pelo menos 195 buscas; pedidos de informação a pelo menos a 5 organismos do Estado (Assembleia da República e ministério dos negócios estrangeiros).
De salientar que a defesa de José Sócrates vem contestar até o Juiz Carlos Alexandre pela forma como o processo lhe foi atribuído. Já não faz o mesmo em relação ao Juiz Ivo Rosa que ficou com o processo após 3 sorteios. Algo que até chega a ser suspeito na opinião de muita gente. E a mim levanta-me dúvidas.
O processo começa logo a ser inquinado com a detenção de José Sócrates no aeroporto ainda sem a acusação completamente montada. E de seguida com a destruição das escutas telefónicas ordenada pelo juiz presidente do Supremo Tribunal de Justiça o meritíssimo Noronha do Nascimento.
E isto prejudicou gravemente o trabalho do Ministério Público, que o levou a demorar mais tempo para conseguir atar todas as pontas da acusação.
A juntar a isto ainda o diferendo jurídico de a partir de quando é que os prazos de prescrição do crime de corrupção de veriam passar a ser contados: se na altura do recebimento da vantagem ou à data provável do acordo ou pedido do “favorzinho” em troca da prenda.
Já noutro processo onde Isaltino Morais, presidente da câmara municipal de Oeiras foi arguido, o crime de corrupção também caiu por terra exactamente porque o entendimento do tribunal foi o de contar o prazo a partir do acordo para o “favorzinho” e não quando o dinheiro chegou às contas do sobrinho taxista na Suíça.
Agora com o acórdão do tribunal constitucional em 2019 sobre esta matéria fica claro que o prazo passa a contar a partir das reuniões e ou acordos para os “favorzinhos” e não quando o dinheiro cai nas contas dos arguidos.
Mais uma borla dada a José Sócrates pelo sistema que neste processo não deverá ser julgado pelos crimes de corrupção passiva de titular de cargo público.
E nós todos a atiramos nos à “pedrada” ao Juiz Ivo Rosa. O homem não faz as leis, ele apenas as interpreta. Quando o processo lhe chegou às mãos e ele teve que o ler e depois proceder ao debate instrutório (ouvir os argumentos do MP e das defesas dos arguidos) já muitas peças chave tinham ficado pelo caminho, o que o obrigou legalmente a ter de deixar cair alguns crimes da acusação.
Ivo Rosa é apenas mais uma peça da engrenagem do sistema judicial português. As leis são na sua maioria feitas na AR. Os deputados desta nação valente enchem a boca com a promessa de uma grande reforma da justiça; o PS prometeu quando foi para o governo uma reforma.
Mas o crime de enriquecimento ilícito de titular de cargo publico não avança porque esbarra no Tribunal Constitucional.
E os deputados que até nem querem mudar coisa nenhuma. Não propõem uma alteração constitucional para que se possa acomodar esta lei.
O Código do Processo Penal está velho; caduco e fora do tempo e da realidade. Principalmente para os crimes de colarinho branco.
Dá muito jeito à classe política portuguesa que a malta ande por aí a “apedrejar” o juiz Ivo Rosa na rua. Quando todos sabem que a culpa do sistema estar podre é mesmo de quem senta o rabiosque em São Bento. Mas o juiz está mais à mão de semear. É mais fácil.
Quando o PS vem para a rua pela boca de Fernando Medida, seu freteiro-mor, acusar Sócrates de destruição do capital de confiança na classe política, aqui vemos a hipocrisia do PS no seu melhor. A tentarem livrar-se do activo tóxico chamado José Sócrates. O PS está cada vez mais parecido com o BES. Por muito que se tente separar o PS bom do PS mau não se consegue. Não há fundo de resolução que aguente. E no final tal como no BES serão os contribuintes portugueses a pagar toda esta marmelada.
Tenhamos então alguma esperança no recurso que o MP vai apresentar sobre as decisões do juiz Ivo Rosa.
Das 6728 páginas do despacho do referido meritíssimo, há uma citação que me ficou e que vos transcrevo.
“Interpretar uma lei é atribuir-lhe um significado, determinar o seu sentido afim de se entender a sua correcta aplicação a um caso concreto”
E se formos ler o artigo 9º do Código Civil terá lá algo muito semelhante a isto: “Na interpretação da lei não nos devemos cingir à letra da lei, mas a conclusão a que chegarmos deverá ter o mínimo de correspondência verbal.”
Por isso, em vez de queimarmos juízes em praça pública, devemos mas é ir ao cerne da questão se isto está como está é porque elegemos parasitas em vez de estadistas.
E o melhor exemplo disto vem outra vez de dentro do PS.
O deputado e vice-lider da bancada do PS no parlamento. Pedro Delgado Alves no uso da palavra no hemiciclo sobre este caso propõe que o PS faça uma auto-critica e um exame de consciência de como é que uma pessoa como Sócrates chegou a líder do partido e primeiro-ministro.
Logo de seguida a deputada Ana Catarina Mendes, líder da bancada do PS, insurge-se contra tal ideia. Para quem não sabe esta senhora é casada com o ex-deputado Paulo Pedroso, aquele que se safou por ter muito boas ligações ao caso Casa-Pia.
Quando quisermos atirar pedras ao Juiz Ivo Rosa, paremos e lembremo-nos de quem, com o seu voto e abstenção, permitiu que tudo isto acontece-se.
Se há um culpado aqui são os portuguese, que sabem tanto sobre futebol e outras trivialidades, mas sabem tão pouco de cidadania.
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